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14/04/2014

Fundação organiza workshop sobre pesquisa em biobancos

Priscila Sarmento


Biorrepositórios, biobancos, pesquisa clínica ética e análise ética foram assuntos do workshop organizado pelos Institutos Nacionais de Saúde (NIH, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, em parceria com o Instituto Nacional de Infectologia Evando Chagas (INI/Ipec/Fiocruz). No encontro houve um debate sobre o valor social das pesquisas, o valor da pergunta científica e a dimensão dos limites do corpo, numa perspectiva das ciências da saúde e da filosofia. Mais do que resolver questões, o workshop problematizou de forma criativa o futuro de diversas investigações, como foi o caso do debate sobre coleções biológicas, como biobancos e biorrepositórios. Esse vasto material que se encontra guardado em diversos laboratórios pelo mundo gerou e poderá gerar problemas éticos, já que são amostras biológicas que possibilitam estudos diferentes daqueles que geraram a coleta das amostras. Ao mesmo tempo, trata-se de amostras de grande potencial médico e de saúde pública, já que contribuem para o estudo de doenças e de tratamentos até então desconhecidos. Tais amostras podem auxiliar pesquisas relacionadas ao HIV, como marcadores de progressão da doença e outros fatores que afetam diretamente a sobrevida do paciente doador ou de outras pessoas que venham a se beneficiar de determinados resultados de estudos clínicos.

Christine Grady: a pesquisa clínica ética deve ser desenhada de forma metodologicamente rigorosa, que produzirá dados confiáveis e generalizáveis e interpretações válidas e viáveis

 

“O biobanco é uma coleção organizada de material biológico humano e informações associadas, coletado e armazenado para fins de pesquisa”. Explicou o filósofo Joseph Millum, que atua entre o Centro Clínico do Departamento de Bioética e a Divisão de Política Internacional de Ciência, Planejamento e Avaliação do Centro Internacional Fogarty, em que presta consultoria ética e apoio educacional. As funções de um biobanco são de coleta e recebimento de amostras, manutenção, controle de acesso, minimização dos riscos, revisão das utilizações propostas, consulta e comunicação com as partes interessadas.

A palestra contou também com a participação de Christine Grady, chefe do Departamento de Bioética e Chefe da Seção de Seres Humanos do NIH. A palestra dela teve como tema O que torna uma pesquisa clínica ética? Christine lembrou que a pesquisa tem como objetivo gerar conhecimentos úteis sobre a saúde e as doenças humanas. “O objetivo da pesquisa não é beneficiar os participantes. As pessoas são os meios para o desenvolvimento de conhecimentos úteis e, portanto, há risco de exploração. A pesquisa clínica ética deve ser desenhada de forma metodologicamente rigorosa (poder estatístico e métodos estatísticos), que produzirá dados confiáveis e generalizáveis e interpretações válidas e viáveis".

O diretor-adjunto do Núcleo de Bioética do Instituto Nacional de Pesquisa do Genoma Humano e membro do corpo docente do Departamento de Bioética NIH (National Institutes of Health) Ben Berkman, discorreu sobre  O consentimento informado para a pesquisa com amostras armazenadas. “É importante a proteção, pois existem alguns riscos para os doadores de pesquisas futuras. Normalmente, as pessoas devem decidir se querem enfrentar esses riscos”.  A contribuição é importante, pois o uso das amostras em pesquisas envolve indivíduos que contribuem para os objetivos da pesquisa. “Os indivíduos devem decidir os projetos para os quais contribuirão”, comentou. Essas considerações proporcionam uma forte razão para que se obtenha o consentimento dos doadores para usar suas amostras em pesquisas futuras.

Outro tema abordado foi o da professora titular de enfermagem da Universidade de Brasília Dirce Guilhem, que abordou a regulamentação brasileira. Dirce apresentou e analisou a legislação brasileira sobre o estabelecimento de normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados e seus derivados. “A resolução nº 466/2012, que se refere a diretrizes e normas regulamentadoras, deve ser cumprida nos projetos de pesquisa envolvendo seres humanos que, por sua vez, devem ainda atender aos fundamentos éticos e científicos, também exigidos na resolução”, complementou. Dentre as exigências está a obrigatoriedade de que os participantes, ou representantes deles, sejam esclarecidos sobre os procedimentos adotados durante toda a pesquisa e sobre possíveis riscos e benefícios.

O coordenador-adjunto do Comitê de Ética e Pesquisa do INI/Ipec, Marcelo Ribeiro, debateu a ética em biobancos na pesquisa brasileira. “O termo ‘biobanco’ ou ‘bioteca’ é utilizado cada vez mais para denominar o acervo de material biológico. Podem ser conservados tecidos, células, sangue, urina, líquor e toxinas”. Ele citou o exemplo do Elsa-Brasil (Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto), que é uma investigação multicêntrica de coorte composta por 15 mil funcionários de seis instituições públicas de ensino superior e pesquisa das regiões Nordeste, Sul e Sudeste do Brasil, na qual a Fiocruz se inclui.

No estudo, cujo propósito é investigar a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares e o diabetes, os participantes consentiram na guarda de sangue e urina. Segundo Ribeiro, esse material possibilitará estudos como a identificação de novos biomarcadores de doenças diagnosticadas no decorrer do estudo. Apesar de os biobancos representarem uma certa tradição para pesquisas nos Estados Unidos e na Europa em estudos epidemiológicos, ainda são objeto de grandes polêmicas. Como essa tradição ainda não está solidificada no Brasil, o conhecimento dos problemas e de suas soluções em outros países pode colaborar para evitarmos erros e, assim, acelerarmos a formação de biorrepositórios e biobancos que gerem pesquisas clínicas de excelência, éticas e com retorno para a sociedade.

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