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02/08/2013

Fiocruz sedia debate sobre proteção social na agenda do desenvolvimento pós-2015

Danielle Monteiro


A importância do debate acerca da proteção social no âmbito da agenda de desenvolvimento pós-2015 foi o tema abordado na palestra Saúde e desenvolvimento sustentável, proferida na quinta-feira (1°/8) pelo diretor do Centro Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (Centro Rio+), Rômulo Paes de Sousa, na Fiocruz. O evento foi promovido pelo Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz) e contou com a presença de seu coordenador, Paulo Buss, e do vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Valcler Rangel.

O diretor do Centro Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (Centro Rio+), Rômulo Paes de Sousa, na palestra na Fiocruz (Foto: Peter Ilicciev).

 

Paes deu início à palestra definindo o que é Proteção Social, que, segundo ele, do ponto de vista econômico, são ações combinadas que visam prover bens e/ou serviços às populações pobres ou portadoras de outras vulnerabilidades, com o intuito de prover rede de proteção a essas populações, protegê-las contra riscos e choques sociais e econômicos, contribuir com a superação da pobreza e promover a equidade social. Ao fazer uma abordagem sobre a mudança na política de assistência social, ele contou que a assistência social, até pouco tempo atrás, tinha pouca presença na resposta às grandes catástrofes ocorridas no país, e passou a integrar os comitês de crise somente recentemente. Ele destacou que a agenda de desenvolvimento pós-2015 impõe um desafio às nações, já que requer a construção de um consenso em torno de metas e possibilidades compartilhadas na área social, integrando vários setores nesse chamado grande grupo de políticas sociais.  “Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) se constituíram em uma experiência positiva para que se pudesse forjar esse entendimento. E o que vem após 2015 tem a responsabilidade de buscar o mesmo grau de coesão e requer uma atualização de agenda além da incorporação dos avanços alcançados do ponto de vista técnico e de gestão de políticas públicas”, enfatizou.

Ele ainda enfatizou que o debate acerca da proteção social é importante devido à relevância que ela tem para as políticas públicas e, sobretudo, ao impacto que tem sobre elas. E a transferência de renda na América Latina é exemplo disso, segundo ele. Para mostrar essa importância da Proteção Social, Paes apresentou um estudo do Banco Mundial que apontou, entre 1995 e 2010, redução significativa das populações mais pobres e aumento do número de pessoas pertencentes à classe média em 18 países da América Latina e Caribe, que fazem uso de políticas de transferência de renda e têm uma situação atual favorável em contexto de crise mundial. “Esses países buscaram ampliar a renda das populações mais pobres, mas eles não pretendiam travar o enriquecimento dos mais ricos, o que aconteceu em função de outros fatores”, esclareceu. Outra pesquisa apresentada no encontro, realizada pelo Banco Central do Brasil entre 2003 e 2014, mostrou justamente a redução dos seguimentos mais empobrecidos no país, as classes D e E, de 16,4% e  8,6% respectivamente. “Ao mesmo tempo, o estudo indicou o aumento de 60,2% da classe C durante esse período”, acrescentou Paes.

De acordo com estudo do Ministério da Fazenda, também apresentado por Paes, com a implantação dos programas Bolsa Família, Brasil Sem Miséria e Brasil Carinhoso, 22 milhões de brasileiros saíram da extrema pobreza entre 2011 e início de 2013. “Grande parte do aumento de renda dessas pessoas se deu em função da transferência de renda não apenas pelo Bolsa Família, mas também pelos benefícios de prestação continuada, que atende a 3, 5 milhões de idosos com renda abaixo de um salário mínimo”, afirmou. Segundo ele, como o recurso é transferido diretamente para essas famílias, ele gera impacto na vida dessas populações, expandindo o investimento das mesmas. Além disso, os estudos mostrados por Paes indicaram relação da implantação do Bolsa Família com aumento do PIB no país, com a evolução do Índice do Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) e ainda relação entre aumento da cobertura com o crescimento do orçamento de países como Brasil, Peru, México, Jamaica, Honduras e Colômbia. Além disso,  pesquisa realizada por Paes e outros pesquisadores, que incluiu 2.853 municípios brasileiros, revelou que programas de transferência de renda, em países de média renda como o Brasil, podem contribuir significativamente para o declínio da mortalidade infantil em crianças menores de cinco anos e para a redução de internações hospitalares e de óbitos atribuídos a causa associadas à pobreza, tais como diarreia e má nutrição. “Esses estudos mostram também que a transferência de renda pode provocar mudanças no comportamento das famílias que, com o aumento em sua renda, acabam por consumir mais alimentos e de melhor qualidade”, explicou.

Os dados obtidos, para Paes, reforçam a importância da Proteção Social como um importante componente na agenda pós-2015. “Por ter um caráter iminentemente distributivo, a Proteção Social contribui para a redução das desigualdades e tem como área de ação a proteção contra volatilidade e incertezas do cenário econômico, além de ter um discurso contemporâneo alinhado com temáticas que estão em debate, tais como direitos, equidade e sustentabilidade”, disse. No entanto, o debate sobre a temática, para Paes, impõe certos desafios, uma vez que a proteção social requer a conversão de políticas, ainda precárias, em modelos legais e mais robustos, o que não é simples. Além disso, segundo ele, a proteção social tem certos limites e requer abordagens multi-setoriais e um equilíbrio entre transferências de benefícios e organização de serviços. Para superar essas questões, Paes propôs uma política de proteção social ampla baseada em direitos, na articulação de políticas nacionais e subnacionais, na proteção das vulnerabilidades e combate à pobreza, e que tenha ainda vinculação com outras políticas sociais e econômicas e ênfase na prevenção e promoção. “Quando falamos em transferência de renda, precisamos de políticas com ações curativas, que ataquem os determinantes sociais da pobreza e das diversas vulnerabilidades, como a violência contra a criança e a mulher, entre outros grandes temas da proteção e da assistência social”, finalizou.

Rômulo Paes de Sousa é médico epidemiologista, especialista em avaliação de políticas públicas e em medicina social, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e PhD em epidemiologia, pela Universidade de Londres. Paes liderou o desenvolvimento do Atlas das Desigualdades para o Ministério da Saúde e é um dos coordenadores do Observatório das Desigualdades da Fiocruz. Atuou como docente, pesquisador e consultor em epidemiologia, sistemas de informação em saúde e em saúde pública no Brasil e em países como Reino Unido, África do Sul e Egito.

Centro Rio +

O Rio+ é um centro internacional de excelência em políticas e práticas de desenvolvimento sustentável criado para facilitar a pesquisa e o intercâmbio de conhecimentos, além de promover o debate internacional sobre o desenvolvimento econômico, social e ambiental, integrando governos e sociedade civil. Foi recentemente inaugurado na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, sendo um legado da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), ocorrida na capital fluminense no ano passado. 

Embora sediado no Brasil, a atuação do Centro vai se dar a nível global, uma vez que ele é fruto de parceria entre o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e o governo brasileiro. Uma de suas primeiras atividades será dar continuidade às discussões iniciadas pelos Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável, lançados pelo governo com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) antes da realização da Rio+20. O Centro vai trabalhar quatro temas prioritários: clima; erradicação da pobreza; cidades; e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que serão estabelecidos até 2015 para dar continuidade aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).

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